Isabela

Isabela entrou no ônibus junto comigo, na minha frente. Calça jeans, sapatos baixos, blusa larguinha, mochila preta.

O ônibus já estava cheio quando entramos (Jacaré - Ipanema), ali na Presidente Vargas. Isabela ficou de pé, tal como eu, segurando a mochila de lado. 

Por sorte, na frente dela, as duas moças sentadas saltaram, e Isabela logo se posicionou na janela. Ao seu lado, um rapaz por volta dos seus 45 anos. Ela deveria ter uns 32. 

Assim que sentou e recostou, suspirou. Abriu a mochila vagarosamente, e tirou um livro e começou a lê-lo. Não consegui ver o título, nem se era técnico e/ou romance. Ela marcava o livro com uma lapiseira, em alguns momentos.

Eu vim a observando, ao longo do trajeto, sem tirar o olho de Isabela. E ela, não tirava os olhos do livro.

Ela era sozinha. Morava sozinha, no seu apartamento, recém comprado, no Bairro Peixoto, em Copacabana. Não era triste. Mas também não era feliz. Era, como dizia, "normal". 

Sua mãe morrera cedo (quando tinha 20 anos); e seu pai vivia numa cidade do interior, curtindo a aposentadoria, com a esposa. Já eram velhos, e compraram uma casinha em Friburgo, pra descansar. Gostavam mais do frio. 

Eventualmente, Isabela ia visitá-los. Nem sempre. Uma vez por mês. Não sentia saudades deles. Sentia saudade dos seus livros, dos seus personagens, da praia, das nuvens... ah... as nuvens.

Quando o ônibus passou pelo Aterro, o céu estava um pouco roseado, com poucas e esparsas nuvens. 18h30 e bem quente, já sem horário de verão. 

Isabela fechou o livro, e foi sentindo o vento no rosto, no seu cabelo cacheado, e abria os olhos, e contemplava as nuvens, aquelas que parecem algodão, num céu rosa. Quase pude vê-la sorrir, assim, meio melancolicamente.

Onde estaria Isabela? Que pensamentos povoavam-na? Que sentimentos? Qual seria seu cheiro?

As pessoas me acham estranha, mas tenho curiosidade sobre o cheiro das pessoas. Não de perfume-sabonete-shampoo, mas cheiro da pele, cheiro do cabelo, cheiro da roupa. 

Isabela parecia ter cheiro de suor, de cansaço, de silêncio. Ou de nuvem. 

Isabela sequer me viu, olhando para ela. Olhou, com timidez, para a minha bolsa, com bombons marroquinhos. E sorriu. Mas não viu meus olhos de admiração para seus olhos admirados.

Voltou a olhar para fora, e sentir o vento. Era isso: Isabela teria cheiro de nuvens brancas, num céu rosa, de uma segunda-feira qualquer.

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