Postagens

Mostrando postagens de 2020

Em observação, no Edifício Santa Fé

Hoje é terça-feira. São 18h22. Estou no Edifício Santa Fé, sentada no portão.  Ao meu lado direito, um jardim.  Ao meu lado esquerdo, um portão fechado. Na minha frente, um jardim. O celular bipa. WhatsApp do João Victor. Bipa novamente. Notificação da agenda. Bipa novamente. WhatsApp do João Victor.  Uma mulher passa ao meu lado. - Eu tenho a chave aqui, você quer? De nada. O celular bipa. WhatsApp da Lohraynne.

A moça (com nome) coração

O nome da moça é parecido com " coração ". Ela mesma é parecida com coração. (Por isso, o "com nome" entre parênteses no título.  Você pode ler: "A moça com nome coração" Ou pode ler: "A moça coração") Seus olhos são coração.  Seu sorriso é coração. E quando canta - sorrindo - é coração.  Eu mesma a conheço há pouco. Não sei quanto tempo tem.  Ainda, só virtualmente. Apesar de isso não parecer influenciar pra perceber o coração nos olhos e no sorriso e quando canta. Tive a experiência de ouvi-la lendo Jung. Apesar da dificuldade da leitura, foi, literalmente, música para os meus ouvidos. Tive o privilégio de ver e ouvir presentes que ela deu e cantou para alguns senhores. E quando ela cantou para a nossa colega. E para nós.  Na época que antecedeu as festas, podemos ver fotos da sua família. Filhas e mãe abrilhantavam as fotos. A mãe? Deu para perceber, ainda que pela foto, da onde veio o coração da moça. Os cabelos brancos. O olhar doce. As mãos

Em observação, no Uber - 42

Hoje é sábado. São 14h25. Estou no Uber, sentada.  Ao meu lado direito, porta fechada e janela aberta. Ao meu lado esquerdo, um banco vazio. Na minha frente, um banco vazio. 

Em observação, no Edifício Jabre

- É. É, neste caso acho que não. É, mas ai com ela e não com ele. Hoje é sexta-feira. São 17h17. Estou sentada na portaria do prédio dos meus pais. Ao meu lado direito, um portão de vidro. Ao meu lado esquerdo, André sentado mexendo no celular. Na minha frente, um corredor por onde as pessoas passam.  André esta vestido de calça jeans, blusa de manga compdida jeans. Uma mulher passa na nossa frente. É branca, gorda, alta.  - Tá a três minutos. Três minutos.  André esta no celular, olhando o Facebook.  André esta vestindo calça jeans, blusa de manga comprida jeans, relógio no pulso direito, pulseira no pulso esquerdo, tênis preto e máscara preta. E três brincos de argola na orelha esquerda.  Dois minutos.  André esta vestindo calça jeans, blusa de manga comprida jeans, relógio no pulso direito, pulseira no pulso esquerdo, tênis preto e máscara preta. E três brincos de argola na orelha esquerda. Esta no celular, olhando o Facebook.  - Um minuto.  Ta no Rio Sul.  Eu rio. André esta vestin

Em observação, na casa da Zara

Hoje é sábado. São 13h53. Estou na casa da Zara, sentada na escada.  Ao meu lado direito, uma sacola com roupas, uma caixa com roupas e uma revista Bruna. Ao meu lado esquerdo, a parede branca. Na minha frente, uma sacola de roupas, um espelho de corpo inteiro, um pano sujo e um pé de uma sandália bege.  Por aqui, luzes acesas e tudo silencioso. - Era cliente, Zara? É cliente? Ah. Zara voltou.

Em observação, no Uber - 41

Hoje é sábado. São 12h52. Estou no Uber, sentada. Ao meu lado direito, porta e janela fechadas. Ao meu lado esquerdo, um banco vazio. Na minha frente, duas sacolas em cima do banco.

Em observação, na rua Barão de Itapagipe - 2

Hoje é sábado. São 18:33. Estou na rua Barão de Itapagipe, sentada na mureta.  Ao meu lado direito, o portão do prédio. Ao meu lado esquerdo, o resto da mureta   O celular bipa. WhatsApp da Isabel. Na minha frente, a rua por onde as pessoas passam.  O celular bipa. WhatsApp do Antônio. 

Lorelay

Lorelay nunca gostou do seu nome. Apesar de nunca ter sofrido bullying na escola por causa do nome diferente, sempre foi chamada do nome completo, pela família. Com os erres e ípslons. Lo-re-lay.  Não sei bem a sua idade hoje. Na aparência, parece mais jovem. No mundo de dentro dela mesma, parece mais velha. O que, das duas formas, é ótimo mesmo. Nasceu numa família tradicional mamãe-papai-vovô-vovó da Zona Norte do Rio. Estudou em escola pública, e sempre foi uma boa aluna. Entrou pra faculdade e a vida seguiu, tudo bem. Conforme foi ficando adulta, os amigos a chamavam de Lore. Ou de Ló, apelido que ela odeia, mas é incapaz de dizer que odeia. Dá um sorriso amarelo e segue. O que muita gente não sabe é que Lorelay - estou gostando de chamá-la assim, de nome-inteiro assim. Vou abrir um parênteses aqui. Ao falar de nome inteiro, preciso dizer: apesar dos vários apelidos, Lorelay não tem vários nomes. Ela é inteira. Como nome-inteiro mesmo. Mas fechando o parênteses e voltando é que, po

Polyana

O seu nome é Polyana, com Y mesmo. Porque a mãe, desde nova, é ligada em coisas de numerologia. Na adolescência, na escola, os amigos começaram a chamá-la de Poly e ficou. Se alguém pergunta seu nome, ela logo diz: “Poly, com Y, mas não a mesma daquele livro”. Toda explicativa. Não sei bem a sua idade hoje. Na aparência, parece mais jovem. No mundo de dentro dela mesma, parece mais velha. O que, das duas formas, é ótimo mesmo. Nasceu numa família tradicional mamãe-papai-vovô-vovó da Zona Norte do Rio. Estudou em escola pública, e sempre foi uma boa aluna. Os professores admiravam ela pelas notas. Nem sempre pelo desempenho em sala. Entrava em silêncio, saia em silêncio. Das aulas, da escola. Mas não das amizades. Poly sempre foi menina e mulher de poucos e bons amigos. Desde nova. As amizades vêm e ficam. Algumas vêm e vão. Mas gosta desta fluidez das relações, dos amigos-livres, que podem ir, desaparecer, voltar. Mas que estão pra sempre dentro dela. Nas suas memórias e lembranças. Po

Em observação, no Colégio Pedro II - 2

Um homem passa na minha frente carregando uma sacola. Uma. Uma. Uma. Hoje é domingo. São 08:53. Um. Uma mulher. Uma mulher passa na minha frente carregando uma sacola. Uma mulher passa na minha frente carregando uma bolsa. Um. Uma mulher passa na minha frente carregando. Um homem passa na minha frente. Uma. Uma. Uma. Um homem. Um. Uma mulher passa na minha frente carregando uma bolsa preta. Estou no Colégio Pedro II, unidade Tijuca. Uma mulher passa na minha frente. Um homem. Uma mulher. Um. - Bom dia. Uma mulher. Uma. Um homem passa na minha frente. Uma mulher. Um. Um. Um. Uma. Um. Uma. Um. Uma. Um. Um homem. Uma mulher. Um. Uma mulher passa na minha frente carregando uma bolsa. Um homem. Uma mulher passa. Um homem passa. Uma. Uma. Um. Um. Um. Um homem. Um. Uma mulher passa na minha frente. Um homem passa na minha frente. Uma mulher passa na minha frente carregando uma bolsa. Um. Uma. Uma mulher passa na minha frente carregando uma bolsa e um celular. Ela é branca. Um homem. Um. Uma m

Em observação, no Uber - 40

Hoje é sábado. São 16:36. Estou no Uber, sentada. Ao meu lado direito, porta fechada e janela aberta. Ao meu lado esquerdo, um banco vazio. Na minha frente, um banco vazio.

Em observação, no Colégio Pedro II

Hoje é domingo. Uma. Um. Uma. Um homem passa na minha frente. Um. Um. Uma. Um. Uma. Um. São 08:14. Uma. - Não. Entrar no E Título. Posso tentar de novo? Um. Uma mulher. Uma mulher passa. Um homem. Um. Um homem. Um homem passa na minha frente. Estou no Colégio Pedro II na Tijuca. Um homem. - Sem máscara? Não vi. Uma mulher. - Leva o seu celular então. André passa na minha frente. Um. Uma. Um. Um. Uma. Um. Um homem. Um homem. Uma mulher passa na minha frente. É branca. Uma mulher passa. Um homem passa. Um. Uma mulher passa. Uma mulher passa carregando. Uma mulher passa carregando. Um. Um. Uma. Um. Um. Um homem passa na minha frente. É branco. Uma. Um homem passa carregando. Um homem passa na minha frente. Uma mulher passa na minha frente. É branca. Um. Um homem passa na minha frente. Uma mulher. Uma. Um homem passa na minha frente. Ele é branco, alto e magro. Tem o cabelo branco. Veste blusa laranja. Um homem passa na minha frente. É negro. Uma mulher passa na minha frente. Um homem pass

Em observação, na praia de Copacabana

Hoje é sábado. São 16:13. Estou na praia de Copacabana, sentada no calçadão. Ao meu lado direito, um banco vazio. Ao meu lado esquerdo, um banco vazio. Na minha frente, a areia da praia. Uma mulher senta ao meu lado direito. E coloca a bolsa amarela ao meu lado direito. E sentou ao meu lado direito. É branca, magra. Tem o cabelo comprido, louro e liso. Veste um vestido preto.

Em observação, no Uber - 39

Hoje é sábado. São 13:24. Estou no Uber, sentada. Ao meu lado direito, porta fechada e janela aberta. Ao meu lado esquerdo, um banco vazio. Na minha frente, um banco vazio.

Em observação, no Uber - 38

Hoje é quinta-feira. São 13h10. Estou no Uber, sentada. Ao meu lado direito, porta fechada e janela aberta. Na minha frente, um banco vazio. Ao meu lado esquerdo, André sentado carregando uma mochila preta e sacolas plásticas. E mexendo no celular Samsung. Veste calça jeans. O celular bipa. WhatsApp da Jaqueline. - Que foi, amor? Tá vazando? Faço. Que foi? Vazou alguma coisa? Oi. Tá bom. Tá. Cuidado aqui, oh. Não. Acho que não. Tá bom assim. Eita. Agora que eu vi que é um carro. Será que é esse cara? Desviou de alguma coisa no trânsito. Que loucura.

Em observação, na rua Almirante Barroso

Hoje é quinta-feira. São 12:57. Estou sentada no ponto de ônibus na rua Almirante Barroso. - Pediu do lado errado né? Entendi. O celular bipa. WhatsApp do Jorge e da Priscilla. Na minha frente, André em pé. Carrega uma mochila preta e sacolas plásticas brancas. Veste calça jeans, blusa cinza e tênis preto. Usa uma pulseira preta no pulso esquerdo. Usa máscara preta. Mexe no celular Samsung. - Que foi, André? Que foi, amor? Ao meu lado direito, um banco vazio. Ao meu lado esquerdo, a calçada vazia. Na minha frente, o André em pé. Saiu da minha frente. Uma mulher senta ao meu lado direito. - Oi. André passa na minha frente. Carrega uma mochila preta e sacolas plásticas brancas. Veste calça jeans, blusa cinza e tênis preto. Usa uma pulseira preta no pulso esquerdo. Usa máscara preta. Mexe no celular Samsung.

Em observação, no Uber - 37

Hoje é quinta-feira. São 10:25. Estou no Uber, sentada. Ao meu lado direito, André sentado com uma mochila preta no colo e segurando o celular. Na minha frente, Sérgio dirigindo. Ao meu lado esquerdo, porta fechada e janela aberta. - Que horror. Claro. Sérgio veste uma blusa verde. - Sim. André digita no celular. Coloca a mão esquerda na minha perna. - Pois é. Podia já ter entregue lá atrás. Ele fal pra caralho né? Sim. Sim. Eu acho ele meio chato.

E o alimento foi outro

É época de pandemia. As pessoas passam com medo e muito rapidamente na rua. Se eu já não era visto, agora menos.  Eu estava sentado, no lugar de sempre. Faminto. Sedento. Nos sentidos literal e metafórico. Acho que as escolas não estão funcionando, mas aparece uma menina, de mochila. Não sei quantos anos ela tinha. Só conseguia ver seus olhos, e não sua boca. Não sei se ela sorria. Mas pelos seus olhos, sim. - Você quer água? E, como estava sedento, ela abriu a mochila e me entregou uma garrafa, que trouxe da sua casa, para mim.  E pedi a ela um favor. - Pode dizer - ela disse. - Eu estou muito faminto. Você pode comprar uma comida pra mim? Tem um homem, ali, na outra esquina, que vende comida em um carro.  - Tá. Eu vou ali e volto. Ela demorou mais tempo do que o previsto, e eu já tinha certeza de que ela havia dito "sim", mas na verdade, tinha ido embora. Como estou habituado, a (não) receber. A ouvir "sim", e ver as pessoas fugirem, correrem, terem medo.  Mas ela

Em observação, na Gauísa - 10

Hoje é domingo.  São 09:39. O celular bipa. Email da Posthaus que chegou.  Estou na Gauisa,  sentada. - Oi. Não entendi. Ali perto da portinha. Estou sentada no banco na varanda.  - Você botou os panos para lavar? Não ouvi. Ah sim.  Ao meu lado direito,  um banco vazio. Ao meu lado esquerdo, um vaso de planta e uma lixeira verde. Na minha frente,  um vão, por onde as pessoas passam. - O que? Ah sim. É.  André vem e senta ao meu lado.

Aparecida e a pesquisa

(Escrito em 28 de abril de 2020) O dia era terça-feira. Por volta das 17h.  Raramente meu celular toca. Exceto de telemarketing, com os DDDs 11.  Eis que estou trabalhando e toca um número de celular com DDD 21. - Alô? - Boa tarde, sou a Aparecida, falo com quem? - Oi, Aparecida. Eu sou a Luana. Posso ajudá-la? - Sim. [E falando pausadamente, e meio triste] - Na impossibilidade de encontros pessoais e na rua, por este momento que estamos vivendo caótico, estou fazendo uma pesquisa e a pergunta que quero lhe fazer é: o que você acha do futuro da humanidade? Para onde a humanidade está indo? Incrédula com a pergunta tão provocativa e abrangente, respondo com outra pergunta: - Onde você conseguiu o meu número, Aparecida? - Discamos aleatoriamente, senhora... Luana! [Ela lembrou do meu nome]. Discamos, e quando uma pessoa atende, dizemos "alô" e fazemos a pesquisa. - Ah, que legal, Aparecida! Eu gostaria de não responder a esta pergunta en

A experiência de confinamento - o vizinho pagodeiro

(Escrito em 07 de abril de 2020) Este momento de COVID19 nos causa temor, ansiedade, até um certo pânico. Eu e minha família estamos reclusos totalmente. Hoje faço 21 dias sem sair de casa. Nem para ir ao mercado. Todas as compras que precisamos fazer, fazemos online. Mas aconteceu um fato inédito. Dois, na verdade, seguidos. Há um prédio, na minha rua, mas distante do meu por duas quadras. Este, é mais alto que o meu. E no domingo retrasado, dia 05 de abril, ouvimos um barulho. Como se fosse alguém cantando bem próximo a nós. Fomos procurar e entre tantas varandas e prédios, achamos o cantor. Chama-se @plcantor. Ele estava tocando pagode, da sua varanda, para seus vizinhos.  Microfone, amplificador ligado, ele com a ginga, e ainda podia divulgar o seu trabalho (e o seu instagram!) E, da minha casa, distante uns bons cem ou cento e cinquenta metros, podíamos ouvi-lo com nitidez. Daqui de casa, dançamos o pagode do @plcantor. E ouvíamos os vizinhos aplaudindo, com

Aniversário da amiga

Imagem
(Escrito em Janeiro de 2020) Eu estava trabalhando. Tranquila, feliz, e cheia de trabalho, como é o dia-a-dia. Numa zapeada rápida no facebook, vi que era aniversário de uma colega de trabalho, que trabalha em outro andar, diferente do meu. Apesar de a gente ter pouco contato físico e pouca interação (só quando passamos uma pela outra), gosto muito dela. Principalmente, porque ela tem uma profissão que amo: bibliotecária. Sabe livros? A gente os ama. E era aniversário dessa pessoa. Corta. Eu cuido de alunos que estudam EaD. De toda parte do Brasil e do mundo. E faço a gestão dos grupos do whatsapp. Um dos grupos, 40 alunos. Eis que vejo os alunos interagindo por ali sobre a biblioteca, que não-sei-bem-que-problema-deu. Eu precisaria dar o e-mail da colega para eles resolverem. Sim, o e-mail da moça que faz aniversário hoje. Eis que... E eu precisei ir ao andar dela, para resolver coisas em outro setor. E passei na biblioteca dela (ai de vocês que digam que a bibli

Ligou engano

(Escrito em Janeiro de 2020) Eram quase 23h. Por um motivo qualquer, eu ainda estava acordada. Momento raro, neste horário. O celular toca. Número restrito. Aquele micro-segundo. - Filha em casa? Marido em casa? Todos em casa. Vou atender, né? Vai que... - Alô. - Mãaaaaee.... Sinto cheiro de golpe e a minha veia humorada não estava saltada dessa vez. - Ligou engano, amigão. A mesma pessoa que me chamou de mãe, não mais que de repente, diz: - Oi, minha linda... - com a voz do antigo tele-sexo (ainda existe isso?) - Continua ligando engano. Não sou a sua linda. São 23h. Ele não espera que eu tenha bom humor neste horário, né? - Ah, você não é a minha linda...? - com a voz ainda mais sensual. Coloquei o celular no viva voz. E entra o marido no quarto. - Quem era amor? - Engano, paixão. Primeiro um rapaz achando que eu era a mãe dele. E em seguida achando que eu era a linda dele. Ou seja: não era pra mim. Ligou engano. E eis