A irmã esquizofrênica
(Escrito em 29 de dezembro de 2014)
Esta noite quase não dormi. Uma
dor ininterrupta na coluna, parece que piorou esta noite, apesar dos relaxantes
musculares a cada 6h. A falta de posição e a dor insuportável me fizeram ver o
dia nascer, devagar. Sentir a quentura do meu corpo, e da cama, e da dor que
vem do pescoço, ombro, braços, costas.
Levantei cedo, para ter tempo de
me arrumar vagarosamente, para vir trabalhar.
Tirar a roupa e tomar banho
exigiam movimentos antes desconhecidos. Qualquer movimento maior dos braços
doía muito.
Pensei numa roupa fresca e
coloquei um vestido azul, de bolinhas. Estou queimada de sol e aproveitei pra
colocar, também, um batom vinho.
Até me acharia bonita hoje não
fosse meu olhar triste, de dor. Odeio sentir dor.
Estou no Espaço da Mulher.
Aprendi, com a Alba, de deixar as duas portas do Espaço abertas, não só para
ventilar (nosso ar condicionado está quebrado), mas para atrair pessoas a
entrarem e podermos mostrar o Espaço da Mulher, o brechó e o meu Plantão.
Hoje eu teria paciente às 11h.
São 11h21 e ela não apareceu. Como não costuma atrasar, acho que não virá.
Estava lendo quando uma senhora
entra, perguntando se a Defensoria não vai abrir hoje.
Não sei, respondi. Nós aqui não
somos a Defensoria.
São uma lojinha? – sem nenhuma
conotação diminuta pelo diminutivo. A senhora era que era fofa mesmo.
Não. Somos o Espaço da Mulher, e
temos este brechó social, apontando para as roupas, bolsas, colares dispostos.
A senhora sorriu e contou da sua
irmã, esquizofrênica. Não pode trazê-la para a Defensoria, pois se ela tiver
surto, ela irá para o Pinel, e nenhuma das duas deseja isso. Então, ela (a
senhora na minha frente) buscava alguma ajuda na Defensoria.
Eu ouvia, atenta, olhando para
ela. Nós duas em pé, do lado de fora.
Ela olhou dentro dos meus olhos e
disse: “que linda que você é. Daria uma pintura linda. Olhando para você,
assim, olhando para mim, dá vontade de ficar só olhando para você. Linda mesmo.
Muito linda. Obrigada”.
Eu, que estava com muita vontade
de chorar de dor, e não conseguia, desde madrugada, agora, choro das lágrimas
rolaram. De dor e de agradecimento.
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