Ele estava caído

(Escrito em 02 de janeiro de 2015)

Eu estava há dias sem malhar, por conta de um problema na coluna. Sem saber se o problema é (era) sério ou não, apesar de ter ido ao médico e ele me impedido de fazer musculação.

Resolvi ir hoje à academia, antes do tempo previsto pelo médico (que seria segunda-feira). Fiz 1h de bicicleta (quase 30 km) e, sem qualquer dor, suei muito. Consegui meditar (sim, eu medito em movimento) e suar monte de coisas que eu precisava, inclusive a dor.

No caminho de volta, as pernas estavam quase anestesiadas (sem dor, mas um tanto quanto inseguras). Outro caminho escolhi, pois precisava passar na farmácia antes de voltar pra casa. Atravessei a rua e fui pelo outro lado do que o habitual.

Eu o consegui ver. Estava de costas para mim / meu caminho.

Era um senhor, de cerca de 70 anos. Talvez menos, mas a condição-da-rua o fazia mais velho na aparência.

Estava caído, na rua. Não tinha caído naquele momento. Não tentava levantar-se. Não dormia.

Acordadíssimo. Consegui ver um filete de sangue próximo a ele, no chão. Não sei dizer se o sangue era do ombro, do rosto, da boca, do nariz. Não importa. O sangue era claro: era sangue, sim senhor.

Algumas pessoas passavam. Paravam. Olhavam. Murmuravam qualquer coisa que podiam significar "que-horror", ou "esses bêbados".

Sim, o senhor estava bêbado. Não importa, no entanto, se era um bêbado ou se estava bêbado.
Era um velho. Caído. Sangrando. Olhos abertos.
Seus olhos, apesar de embriagados, pediam socorro.

Eu me mantive ali três segundos. Três. Segundos. A poucos metros dele.
Eu queria ter me abaixado. Oferecido ajuda.
Ter dado uma mão.
Sim, ele estava sujo, imundo.
Eu também, oras. Encharcada de suor. Qual a diferença de nós dois?
Podia, sim, ter dado a mão.
Minhas pernas anestesiadas não me impediam de me agachar. Eu podia.

Queria ter comprado uma garrafa d'água e limpado onde estava sangrando, ou jogar no seu rosto e ajudá-lo a se levantar, ou ter comprado um café forte, pra ajudar a curar a bebedeira.
Ou deixar ele falar, com aquela voz enrolada, e ter ouvidos para apenas ouvi-lo.

E você, Luana, o que fez?
Foi embora.


Senhor, eu sequer sei seu nome.
Ou o motivo que o fez estar no chão. Ou bêbado. Ou sangrando.
Só quero te dizer, senhor, que eu me acovardei. Eu podia tê-lo ajudado. E não o fiz.
Que o senhor, ainda em pensamento, possa perdoar a minha ausência de ato.
Apesar de nada fazer, eu me senti afetada. Senti afeto pelo senhor.
Que o seu coração frágil possa perdoar o meu.

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