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Em observação, no CMNG

PARTE 1 Hoje é dia 20 de junho, 5ª feira, são 8h27. Estou no Centro de Medicina Nuclear da Guanabara, no Centro, aguardando o meu exame. Estou sentada numa recepção, logo à frente (existem muitas cadeiras, talvez umas 50, atrás de mim). Na minha frente, uma pequena mesa com café. E, três portas: uma na minha frente, que parece banheiro; uma do lado esquerdo; e uma do lado direito. A recepção em si (com os guichês) fica ao meu lado direito, mas atrás de mim. Do lado de trás, a porta de entrada do andar. Sentada, ao meu lado direito, tem uma moça também aguardando. Veste calça preta, casaco preto, bolsa preta. ´w branca, magra, baixa. É loira e tem o cabelo liso, comprido. Olha a TV, no jornal da manhã. A moça da limpeza passa e entra na porta da direita. Uma moça sai da porta da direita e entra na porta da esquerda. Ela sai da porta da esquerda e vai para a recepção e, depois, entra na porta da direita. Uma senhora senta ao meu lado. Veste calça verde, casaco preto,...

A menina, a mãe, a avó

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Eu não estava lá; mas nem importa. Nossos contos, a quatro mãos, são sempre fotografados por uma, escritos pela outra. Uma tem olhos; outra, tem dedos. Ambas, têm sintonia e sensibilidade de perceber o outro. =========================================== Estava eu na França, quando vi, ao longe, uma catedral. Não sou católica, nunca fui. Mas as catedrais me encantam. Os vitrais coloridos, que, sob a luz do sol fresco iluminam o interior; a energia do lugar; as pessoas  da cidade que entram, fazem a sua reza, e saem. Toda a atmosfera me encanta neste tipo de ambiente.  Os museus são para serem contemplados; as catedrais, para serem sentidas. E eu gosto mais de sentir do que de ver.  Neste dia, dei sorte. Na catedral, um coral ensaiava. O professor regia a turma - de homens e mulheres, com uma faixa entre 20 e 40 anos -, que, no altar, cantava concentrada, para a apresentação de tarde. Esta não era, portanto, uma apresentação do coral, mas sim um ens...

Sandra

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Eu a conhecia pelo telefone, assim, bem profissionalmente. Só repassando minhas ligações, igualmente profissionais. Ela sorria quando me ouvia, quando falava. A vi pessoalmente, pela primeira vez, de peruca. Vestida de uma princesa-que-não-lembro-o-nome. Era uma festa profissional, apesar de à fantasia. Falamos pouco. O sorriso que eu ouvia no telefone, ouvi, também, no seu olhar silencioso. Não sei precisar quando começou a amizade. Mas hoje, sendo aniversário dela, ela merece, sim, ser fotografada. Ela já veio almoçar comigo. Tomar café da manhã. Lanchar no meio da tarde. Passar aqui, no dia do meu aniversário. Já trouxe presente. Já levou roupas minhas (e minhas mochilas). Já levou caneca. Já trouxe Coca-Cola. Já trouxe Guaraviton. Já nos encontramos na rua - ao acaso (acaso?) - e a resgatei, pra um café comigo. Já cortei as uvas para ela. Ela já lavou minha louça. Ela já foi ao Jardim Botânico, na minha árvore-avó. Veio - de longe - estar com gente que ela não conhec...

Quinho e o menino

Todos - quase todos - sabem que minha praia é minha igreja. É lá que me sinto inteira. É lá que me renovo para a semana, para a vida, para mim mesma. É lá que fotografo gente - as que podem (e pedem para) ser fotografadas. É lá que me torno inteira com Tha e com Quinho. Tha é amiga muito, muito querida. Quinho, diriam os mundanos, é apenas um fornecedor de mate (daqueles de galão). Mas ele é, também, nosso amigo. E, quem tem o prazer de ser seu amigo, aprende muito com ele.  Ele assiste canais sobre animais. Ajuda os gatinhos filhotes da laje da comunidade a acharem a mãe. Dá cachorrinhos de pelúcia para sua pequena filha, quando, na verdade, queria ter cachorros de verdade, que pudesse cuidar. Ele conta a sua história, sempre, todos os domingos. Ouvimos, sempre, atentas. Ele nos deixa o mate com um pingo de limão. Deixa, também, o brilho no nosso olhar. Ele nos trata pelo nome, deixa o galão no chão, para descansar, conta da sua semana, pergunta da nossa. Às vezes, ac...

Dois casais

Essa é a história sobre dois casais. Eles existem, sim, na vida real. Um casal é Milton e Joana. O outro, é Daniel e Carolina. Falemos dos primeiros primeiro. Milton, 48 anos; Joana, 45. Ambos, moradores de rua, há cerca de 10 anos. Vendem latinhas e, com o dinheiro, conseguem comprar a refeição do dia, a quentinha da Dona Zulmira, que eles dividem entre eles e racionam entre almoço e janta.  Moram embaixo da marquise de bancos, lojas e supermercados, nas imediações do Flamengo, Largo do Machado e Catete. Carregam seus trapos com eles: uma bolsa de roupa suja, e um edredom velho, que acharam no lixo. Não lembram a última vez que tomaram banho. Diferente do que pensam, não são drogados ou ladrões. - A gente nunca precisou roubar nada não senhor.  - E por que vocês vivem na rua? - perguntaria qualquer um. Milton e Joana responderiam com um silêncio olhar para o céu estrelado. Acho que nem eles sabiam porque viviam na rua. Eram felizes, no entanto.  ...

Leonardo e Gabriela, o casal

Este conto é sobre Leonardo e Gabriela, um casal de amigos. Leonardo eu já conheço há uns 10 ou 15 anos. Meu melhor amigo. Daqueles amigos de se falar todos os dias, de cuidar um do outro, de brigar e ficar meses separados, e morrendo de saudade, e não dando o braço a torcer. Amigo de aplaudir as conquistas. Amigo de dar broncas feias. Amigo de falar besteira. Amigo de não falar nada, de ficar em silêncio, longe ou perto. Amigo de dizer, na hora de mais dor: “te amo, tou aqui”. Leonardo, hoje, tem 38 anos, e é o mais velho de 3 filhos, da dona Martha, aeromoça. Não chegou a conhecer seu pai e, como a mãe viajava muito, Leonardo era criado por quem estava disponível. Ficava em casa (na Tijuca), com a empregada – dona Chica, empregada de anos da família – ou com tios, avós, padrinhos. Leonardo se dava bem com a mãe, mas quando a via, o que era raro para uma criança de 5 anos. Leo não gosta de ser chamado de Leo, mas eu sou amiga e posso. Acabou tornando-se um menino calado,...