Postagens

Em observação, no consultório (Copacabana) - 12

Hoje é quinta-feira. São 8h09. Estou no consultório de Copacabana, sentada à mesa, na sala de atendimento, esperando o paciente de 8h. Por aqui, portas e janelas fechadas. Luzes acesas. Ar condicionado ligado. Tudo silencioso, apenas com o barulho do ar. O celular bipa. Whatsapp do paciente. Volto para o silêncio, apenas com o barulho do ar. O celular bipa. Whatsapp do paciente. Volto para o silêncio, apenas com o barulho do ar. O celular bipa. E-mail do Bernardo. Volto para o silêncio, apenas com o barulho do ar. A campainha toca. Paciente chegou. São 8h24. (...) Agora são 9h15. Estou no mesmo local, com tudo silencioso, e o ar condicionado desligado. Espero a paciente de 11h agora.

Em observação, na Caixa

Hoje é terça-feira. São 11h01. Estou na Caixa, no 21º andar, da Superintendência, sentada na recepção. Aqui, não há ninguém. Na minha frente, duas cadeiras vazias e a mesa da Elisa, a recepcionista. Ao meu lado esquerdo, o hall dos elevadores. Ao meu lado direito, duas cadeiras vazias e o andar da Caixa, com as salas. Um senhor passa pela minha frente. É magro, mulato, baixo. Usa óculos. Um senhor passa pela minha frente. É branco, alto, magro, e grisalho. Veste calça jeans, blusa social quadriculada, verde e azul e tênis branco. Ele passa pela minha frente, novamente. Um senhor passa pela minha frente. - Vai... Ele é mulato, alto, magro, cabelo preto. Carrega uma vassoura. Ninguém na recepção, novamente. Um senhor passa pela minha frente. É branco, alto, magro, cabelo preto e usa óculos. Um senhor passa pela minha frente. Ninguém na recepção, novamente. Uma senhora passa pela minha frente. É branca, alta, magra, cabelo liso, comprido, p...

Sexta-feira - véspera do Carnaval

O dia começou cedo, com bastante trabalho. Foi de 8h às 16h, direto. Neste intervalo, atendendo em consultório e convocando candidatos para entrevista (além de outras atividades muito prazerosas). No contato com candidatos, ouvi diversas vezes "Feliz Carnaval para a senhora". Eles mal sabem, mas eu sou muito grata pelas gentilezas que recebo. Finalizando o dia de trabalho, como há tempos não fazia, resolvi dar uma pequena corrida, no meu canto. Coloquei qualquer roupa e o tênis habitual de sempre. Descendo do elevador e procurando o porteiro para deixar minhas chaves na portaria, ouço, atrás de mim: - Vai caminhar, lindona? Olho pra trás, e lá está ele, com roupinha toda esporte também, banho tomado e cheiroso. - Vamos? Bora? Dei um abraço, apertado... - Nada. Hoje é dia de ficar em casa. Boa corrida. Você está linda! Corpaço! - E você é lindo! [Um doce pra quem adivinhar. Começa com Jean e termina com Wyllys. Sim, ele mora no meu prédio.....

Em observação, no Clube do Conhecimento - 4

Hoje é sexta-feira. São 10h17.  Estou no Clube do Conhecimento, sentada na última mesa (mais encostada na parede), mais próxima da janela. Ao meu lado esquerdo, a Angela está sentada. Ela é branca, alta, magra, e tem cabelo curto, branco. Veste calça comprida preta, sapato vermelho, blusa vermelha. Está olhando para a sua esquerda, com os braços cruzados. Na minha frente, uma moça branca, baixa, magra, cabelo comprido, castanho, liso. Veste calça preta, blusa rosa. Olha algo para baixo. Olha para o palestrante. Coloca os cotovelos sobre a mesa, apóia a cabeça na mão. Olha para o palestrante. Coça a cabeça. Angela coça a nuca. Volta a cruzar os braços sobre a mesa. A menina da frente olha algo abaixo, na sua frente. Angela coça o rosto. Olha algo na mesa. Olha para o palestrante. A menina da frente ajeita o cabelo, e apóia a cabeça na mão. Angela apóia a cabeça na mão. Coça o braço. Apóia a cabeça na mão. - Muito preconceito... A menina da frente olha pa...

Em observação, no consultório (Copacabana) - 11

Hoje é quinta-feira. São 11h28. Estou no consultório de Copacabana, aguardando a paciente de 11h que ainda não chegou. Por aqui, portas e janelas fechadas. O ar condicionado desligado. Tudo iluminado e silencioso. 11h33. Tocou a campainha. Paciente chegou.

Em observação, no consultório (Copacabana) - 10

Hoje é quarta-feira. São 19h58. Estou no consultório de Copacabana, sentada, na sala de atendimento. Por aqui, luzes acesas, portas e janelas fechadas, e ar condicionado ligado. Tudo silencioso, apenas com o barulho do ar ligado. O celular vibra. Notificação na agenda de 1h antes da paciente chegar. Volto ao silêncio, apenas com o barulho do ar condicionado ligado.

Espectadora

Eu sou eu. O outro é o outro. Qualquer outro. Você, ele ou qualquer um. E eu acho (só acho) que cada um é a sua melhor companhia. Estamos com o outro De vez em quando De vez em sempre Conosco, cada minuto (minuto?) dos nossos  Mais curtos E longos Dias Eu assisto o outro. Os outros. Você ou qualquer um. Sou uma espectadora / expectadora. De mim mesma. Do outro. Do amor. Do cuidado. Da proteção. Desproteção. Do afeto. Do desafeto. Do cuidado. Descuido. Eu sou Luana. Você é Augusto. André. Pedro. Ernesto.  Com nome próprio. Nome composto. Sobrenome. Ou sem nome nenhum. Você pode ter o nome que quiser. Ou nome nenhum. O inominável. Nem todo mundo precisa de diagnóstico. De DSM. De CID. De patologia. Mas todo mundo. Todo mundo. Eu, você, ele, qualquer um. Precisa, de verdade Verdadeiramente Apenas de si mesmo.

Djalma

Era um dia de semana. Hora do almoço.Talvez um pouco depois, umas 14h / 15h. Eles não me viram, mas eu os fotografei, com precisão. Um casal caminhava, lado-a-lado, de mãos dadas, conversando. Heviane e Djalma. Cerca de trinta-e-cinco anos. Conversavam, normalmente.  Na mesma calçada, em sentido oposto, vinha ele sozinho: Rafael. Cerca de 19, 20 anos. O olhar de Rafael cruzou com o de Djalma, por mais de seis segundos. Era este o tempo máximo de tolerância do moço. - Tá olhando o que, mermão? - Oi? - Que que tu tá olhando aqui? - Tava olhando pra tua mulher não, cara... - Tou falando da minha mulher não, rapá. É pra mim mesmo! Que que tu tá me olhando? - Sei lá, só olhei. - Eu sou quadro? - Oi? - Exposição? - Que? - Obra de arte? - Amorzinho? Djalma? Deixa o moço. Vambora... - Peraê, Viane. Quero saber aqui dele. Falaê, irmão. Desembucha. - Sei não, seu Djalma. - "Seu Djalma". Ficou íntimo agora o cara... - Moço, o senhor me desc...

Em observação, no consultório (Centro) - 11

Hoje é quinta-feira. São 15h20. Estou no consultório do Centro, sentada, na poltrona da sala de atendimento, esperando a paciente de 15h30. Por aqui, portas e janelas fechadas. Tudo aceso. Apenas com o barulho do ar condicionado ligado. O celular bipa. E-mail que chegou. O celular toca. - Luana, boa tarde. Oi João Paulo, tudo, e você? Você é pra vaga de Vendedor, né? Dia 22, às 14h. Você pode anotar o endereço? Ih, João, eu tou fora do meu sistema agora. Você não tem como anotar? Rua Uruguaiana, ___. Isso,  ___ . Sala  ___ . Isso, dia 22, quarta-feira, às 14h. Tá ótimo, obrigada! Não esquece o seu curriculo! Tchau! Volto a ficar em silêncio, apenas com o barulho do ar condicionado ligado.

Sobre corpos

Queria dizer uma coisa, para vocês. Homens e mulheres. Hetero, homo, bi. Ou nenhuma destas opções. O corpo (o seu, o meu, o de qualquer um) é o que temos de mais sagrado Não converse com ninguém Tocando no corpo do outro O outro precisa te dizer No olhar Na voz No sorriso: "me toque" E não estou falando de sexo. Estou falando de dedos - ou mão Em qualquer parte do corpo do outro. Se você é hetero ou homossexual E deseja um outro, uma outra Que você desconheça E você canta essa pessoa na rua Ainda que seja a cantada mais bela Mais singela Mais fofa Uma cantada é sempre uma cantada. No meu caso, cantadas são sempre MAL CANTADAS MAL CONTADAS. Se você, ao cantar alguém Percebe a ausência de olhar A ausência de sorriso A ausência de qualquer-coisa para você Deixe ir. Simplesmente deixe ir. Não toque o corpo de outrem De alguém De ninguém. O único corpo que pode ser sempre tocado É o seu próprio ...