Em observação, no Centro de Diagnose Ocular

Hoje é quinta-feira. São 16h28. Estou no Centro de Diagnose Ocular, em Copacabana, aguardando ser atendida.

Estou em uma área da recepção. Na minha frente, outras seis cadeiras, vazias e uma parede, com uma televisão, ligada no SBT. Atrás de mim, outras áreas da recepção. Do meu lado direito, um corredor, e a entrada da clinica, com uma área com banheiro e bebedouro. Do meu lado esquerdo, Eduardo e sua mãe.

Eduardo tem cerca de 40 anos. Veste calça caqui, blusa social amarela, tênis branco. É branco, alto, cabelo escuro, liso. É barbado. Usa óculos escuros.

Sua mãe deve ter cerca de 65, 70 anos. Usa calça preta, sapatilha preta, blusa rosa. É branca, baixinha e gordinha. Tem o cabelo curto, bem grisalho. Usa óculos. Lê uma revista, destas, de fofocas.

- Vou fechar um pouco os olhos aqui, tá? Tá bom, mãe? O que vai fazer isso. Ruim, né? Que a gente continua sem ver.

- Vamos ver. Vamos sábado. Sábado de manhã.

- Ih, não dá. A senhora também tem, né? Então não vai dar. Então a gente vai sábado.

- Vamos no sábado.

- Ou vai na segunda?

- E vai marcar quando, pra doutora Maria Isabel?

- Pois é, tem que ver.

Uma recepcionista passa pelo corredor, ao meu lado direito.

Eduardo tem as pernas cruzadas e sacode o pé. Olha para mim, através dos óculos escuros.

A mãe de Eduardo continua lendo a revista, concentrada.

Eduardo descruza as pernas. Mexe no cabelo. Batuca as pernas, nervoso. Estica as pernas e sacode os pés. Encolhe as pernas e continua sacudindo, os pés.

A mãe de Eduardo continua lendo a revista, concentrada.

Uma técnica (vestida com jaleco branco) chega até Eduardo.

- Vamos lá novamente? Quer outro lenço?

- Quero.

- Tá tenso, né? Foi?

A técnica pinga colírio nos olhos de Eduardo, que resmunga. Agora, ele tem as pernas cruzadas. Tirou o óculos, enxugou os olhos. Colocou os óculos. Tirou-os novamente. Enxugou os olhos. Olhou para mim. Colocou os óculos. Tirou os óculos, enxugou os olhos. Colocou os óculos. Tirou os óculos novamente.

- Não tira não.

- Tou limpando as beiradas só.

Colocou os óculos novamente. Tem as pernas cruzadas e jogou a cabeça para trás.

Sua mãe continua lendo a revista, imóvel.

Eduardo saculeja as pernas cruzadas. Fungou. Fungou de novo. Tirou alguma coisa do seu bolso direito da calça.

- Esse exame eu vou fazer ali ou aqui?

- Não sei.

Eduardo descruza as pernas, e estica-as.

- Ah, pois é, tem que comprar outro.

Ele conversa com a mãe, de forma que eu não consigo escutar.

- O celular.

- Não, Eduardo, fica quieto.

Eduardo tira o celular do bolso esquerdo da calça, mostra para a mãe, e guarda-o novamente.

Tem as pernas esticadas, e os pés cruzados. Eduardo é um homem alto. Deve ter mais do que 1,80. Funga. Estica e balança os pés. Pigarreia.

Sua mãe continua lendo a revista, imóvel.

- Viu o que a moça falou? Vai dilatar.

A mãe não responde. Nem tira o olho da revista.

- Vai dilatar a pupila, né?

- É.

- Vai ficar maior.

- Sim.

- A pupila é redondinha, é preta, né?

- É.

- É.

Eduardo olha para a televisão, olha para mim, olha para a frente. Descruza e encolhe as pernas. Estica-as. Encolhe novamente.

A técnica passa pelo corredor e entra no hall do banheiro.

- Vou pegar uma água. Quer um pouquinho?

- Não, obrigada.

Eduardo levanta-se e vai até a área do banheiro / bebedouro, onde está a técnica. Eduardo volta, bebendo água. Tem um andar ritmado e pausado. Senta, enquanto bebe água.

A técnica passa pelo corredor, à minha direita.

Eduardo mostra o copo de água para a mãe.

- Não quer água? Quer que eu pegue não?

- Não.

Eduardo se levanta, e volta a área do banheiro / bebedouro. Volta, agora, sem o copo d’água e senta. Pigarreia. Tem as pernas esticadas e os pés cruzados.

A mãe continua a ler a revista de fofoca e sequer olha para o filho.

Eduardo descruza as pernas, ajeita a calça, cruza os pés novamente, com as pernas esticadas.

Uma senhora bem velhinha – cerca de 90 anos – com o neto – cerca de 20 anos – passam pelo corredor, à minha direita.

Eduardo olha para eles passando e olha para a televisão. Saculeja os pés.

A mãe levanta os olhos da revista, olha para a televisão e volta a olhar para a revista (antes que Eduardo puxe um assunto com ela novamente).

Eduardo pigarreia, descruza e encolhe as pernas, para debaixo da cadeira.

A doutora Mariana passa pelo corredor, à minha direita.

- Essa menina é médica daqui.

- Ai, Eduardo. Eu tou me sentindo mal. Não sei não.

A técnica volta.

- Deixa eu dar uma olhadinha no senhor.

- Coloquei os óculos escuros.

- Viu, se salvou. Ta bem dilatadão.

- Até que eu tava gostando.

A técnica sai, rindo.

- Viu, olha como está.

- Nossa.

Eduardo olha o óculos.

- Mas isso é por causa do sol.

- É, mas isso pode sair.

Eduardo, agora, coloca o óculos. Pigarreia. Pega um compartimento no seu bolso, que parece o estojo do óculos.

- Ah, vai ver o grau daqui, né?

- Senhor Eduardo, me acompanha, por favor?

- Vem, mãe.

Ambos se levantam e acompanham a técnica.

(Tchau, Eduardo. Eu teria vontade de ouvir a sua história!)

Estou, agora, sozinha nessa área da recepção. A revista que a mãe de Eduardo lia, jaz, morta, ao meu lado esquerdo. É uma revista de moda: "VOGUE", e uma loira estilosa na capa.

Uma senhora passa pelo corredor, ao meu lado direito.

Uma senhora bem velhinha passa pelo corredor, ao meu lado direito.

Ambas entram no banheiro.

- Senhora Luana?


- Oi, tou indo. Vou fechar aqui.

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