Em observação, no Banco do Brasil

Hoje é sexta-feira. São 13h17.

Estou no Banco do Brasil, dentro do Fórum, aguardando o atendimento.

Ao meu lado direito, um pequeno corredor. Na minha frente, os caixas. Ao meu lado esquerdo, meu tio Nilson. Ele é branco, alto, magro, grisalho e barbado. Veste um sapato marrom, calça bege, blusa laranja. Ele tem blusa laranja.

- Porra, até 100 mil reais recebe aqui. Porra... Não quero te dizer nada não, mas tá no 22 ainda, no mesmo número que a gente entrou.

Ele está sentado, com a mochila sobre o colo e a mão na boca.

- Imagina o pessoal que trabalha nisso o dia inteiro? Vendo número e resolvendo pepino?

Uma senhora passa na minha frente. É alta, branca, loira, cabelo comprido, liso, preso num meio-rabo-de-cavalo. Veste saia preta, blusa estampada, bolsa preta e sapato preto.

- Voce soube do cara que foi de saia trabalhar? Que homem não pode bermuda. Agora pode, né? A Luciana me falou, que agora foi pra recurso, né? Ela falou que as vezes é melhor, porque os outros podem entender que a juíza ainda não autorizou e nem pediu para ouvir prova... como se ela tivesse... Ela falhou de alguma maneira.

Meu tio olha pra trás.

- 23. Bonita a cor do negócio da moça, coral, né? Com a pele dela, fica bonita. Tá me dando fome. Aqui é 12h já. Mais, né? Ih, ó. Não pode usar celular aqui. Nossa, aqui tá no numero 9 ainda. Tóim. Ah, essa senha é cumulativa, desde o início do ano. Porque não tem 700 pessoas, né?

Meu tio abre a mochila, boceja, pega o celular.

- O cara tá até dormindo ali. Quando você me ligou, que eu te liguei, você tava falando baixinho. Ah, falar nisso, você vai fazer aquele negócio lá das novelas? Eu vou fazer. E o Ivo gostou de mim, da leitura que eu fiz. E no CCBB. E vai que pinta um trabalho, em função disso? É. 24.

Meu tio olha pra trás. Guarda o celular. Olha para os lados.

- O nosso colega já entrou. Ele é divertido, legal mesmo. Fala pra moça que não pode usar celular aqui. Vou ter que usar do meu direito? 60.634 reais. Gente, lá é demorado também.

Meu tio olha pra trás.

- Eu não vejo sair ninguém. Daqui a pouco isso aqui vai estar igual a boate Kiss.

Meu tio coça a orelha. Olha para trás. Se levanta. Senta. Ajeita a mochila sobre o colo.

- Você bem que chutou quase certo, né? Umas 50 pessoas na nossa frente. Você viu a megasena acumulada? Pagou 115 mil. Um dia antes eu fui pegar um livro, pra ler, e eu fui pegar e tinha esse papel aqui. Eu não sou nada surpesticioso, mas eu fui jogar. Ah, é pra eu jogar. Eu joguei, mas não deu nada. Ela escolheu os dela, e ai eu joguei. E eu repeti e não deu nada. O cara que ganhou sozinho, 700 mil reais por mês só de rendimentos. Não é muito dinheiro? Não sei nem o que fazer com isso. 26. Cadê o papeliquinho amarelo, gente? Isso aqui que a gente vai pitar ele. E o André(*) contando piada? A gente ri tanto. E ele não sabe contar. E ele dizendo que tinha um fazendeiro, muito rico, e ele começou a observar que os bichos estavam sumindo. E ai ele avisou ao caseiro. Eu vou ficar aqui. E aí ele fingiu que ia dormir, e começou a escutar barulho e levantou, e acendeu a luz, e viu um caseiro com um porco aqui do lado. Ah, agora que eu tou sabendo, você que tá me roubando? Eu? Eu não. Ah, muito bobo. Não viu um porco. Bicho? Ah, que atende também os aposentados. Tem senha especial.

Um senhor passa na minha frente.

- Você podia vir com figurino de velho. Roupão e chinelo. Eu tenho que pagar minha dentadura.

Um senhor passa na minha frente. É negro, alto, magro, cabelo preto, raspado.

Uma senhora passa na minha frente.

- O cara vai rir. Cadê ele? O cabelo dele é pintado. Aquele altão, que tá lá fora? O cabelo dele é pintado. Eu não tou achando a moça. Pior que a moça paga assim: toma o seu? Agora toma o seu. Não, né? A gente assina.

Um casal passa na minha frente. Ele é branco, alto, gordo, cabelo branco. Ela é negra, baixa, magra, cabelo curto, preso.

Meu tio olha para trás. Mexe no cabelo.

Um senhor passa na minha frente.

- Será que quando eles pagam, é aqui que eu venho pegar? Vai ter que vir comigo. Ai, podia sair logo isso, né? O rapaz não entrou não. Tá aquela senhora gorda, ali, mas ele não tá. 27.

Uma senhora passa na minha frente. É branca, alta, magra, cabelo curto, castanho claro.

- Falta 18 pro nosso. Não, 28.

Dois senhores passam na minha frente.

Duas senhoras passam na minha frente. Uma delas é branca, alta, magra, cabelo liso, castanho. Veste calça bege, blusa cinza, sapatilha bege. A outra é mulata, magra, baixa, cabelo castanho, curto, preso num rabo de cavalo. Veste vestido estampado, blusa preta e sapatilha preta.

Uma senhora passa na minha frente.

Uma senhora passa na minha frente. É mulata, alta, magra, cabelo preto, curto, preso.

- O senhor, ali, 766. Acho que ele é especial. Será que esse pessoal ali é advogado?

Uma senhora passa na minha frente.

Meu tio olha para trás. Mexe na barba.

- É engraçado. Pela própria lei, ninguém pode ficar mais de 20 minutos na fila. E aqui é dentro do Forum, e não tem nenhum juiz que vê isso? Eu tenho que processar quem? O Forum? Só que o Juiz não sabe que isso acontece? Um pais bem... Dá pra acreditar nesse país? Só tem dois caixas lá.

Meu tio coça a barba. Está sentado, curvado para a frente.

Um casal passa na minha frente. Ela é alta, magra, branca, cabelo liso, castanho escuro. Veste vestido azul, blazer bege, sapato preto. Ele é branco, alto, magro, cabelo castanho. Veste calça jeans, blusa polo marrom e tênis preto.

Um senhor passa na minha frente.

Meu tio troca de poltrona e coloco a mochila onde ele estava sentado.

Um senhor passa na minha frente.

Uma senhora passa na minha frente. É negra, baixa, magra, usa óculos e tem o cabelo preto, liso, comprido.

Uma senhora passa na minha frente. É branca, baixa, meio gordinha, tem o cabelo castanho, comprido, ondulado. Veste um vestido estampado e um jaleco branco. Carrega alguns sanduiches naturais, na mão esquerda.

Um senhor passa na minha frente. É branco, magro, alto, cabelo branco.

Uma senhora passa na minha frente. É branca, alta, magra.

Um senhor passa na minha frente. É mulato, alto, magro, cabeça raspada. Veste calça jeans, blusa polo rosa, tênis cinza.

Um senhor passa na minha frente.

Uma senhora passa na minha frente. É branca, alta, magra, cabelo comprido, liso, castanho.

Um senhor passa na minha frente. É branco, alto, magro, usa óculos, e é calvo.

Uma senhora passa na minha frente.

Uma senhora passa na minha frente. É alta, magra, branca, cabelo liso, comprido, preso em rabo de cavalo. Veste calça jeans, blusa social xadrez, sapatilha bege.

Um senhor passa na minha frente. É branco, alto, magro, cabelo castanho claro. Veste calça social cinza, sapato preto, blusa social branca e mochila preta, nas costas.

Uma senhora passa na minha frente. É branca, alta, magra, tem o cabelo castanho claro, preso num rabo de cavalo e usa óculos.

Uma senhora passa na minha frente. É negra, baixa, magra, tem o cabelo preto, liso, comprido, e usa óculos.

Uma senhora passa na minha frente. É branca, alta, magra, cabelo preto, ondulado, comprido. Veste calça jeans.

Meu tio passa na minha frente, ajeitando a blusa. Passa novamente na minha frente e senta ao meu lado esquerdo.

- Será que aquela senhora quer sentar aqui? Não sei, tem lugar ali atrás. Ganhou de aniversário? Ah, é. Bonitona. Ah, é igual a minha. Aqui, aqui. O lugar pra garrafa... Muito bom, parabéns. Muito gentil.

Meu tio olha pra trás.

- 37.

Um senhor passa na minha frente. É branco, alto, magro, cabelo branco, encaracolado e usa óculos. Veste uma calça jeans, blusa polo cinza, tênis branco, e carrega um envelope branco, na mão direita.

- Tem internet aqui?

Meu tio ri. Olha para o que estou escrevendo. Ri novamente.

Um senhor passa ao meu lado direito. É branco, alto, magro, cabelo preto, curto. Veste calça social bege, blusa social azul, sapato social marrom. Tem a barba por fazer.

Meu tio está lendo o que escrevo.

- Aquilo não é azul. É tipo rosinha. Violeta. Procura algum azul por perto e olha pra ele. Não é.

Meu tio olha pra trás. Olha pra frente, mexe na blusa. Mexe no cabelo. Olha pra trás.

- 40.

Segura as duas mochilas. Olha para mim.

- Ontem eu fui com a Carla assistir uma peça. Do Mário, amigo dela, que é ator. Caro pra caramba. Não o ingresso, que a gente foi de graça. 

Uma senhora passa na minha frente. É mulata, baixa, magra, tem o cabelo curto, liso. Veste um vestido estampado e jaleco branco.

- Não avisaram alguma coisa e vai ter que voltar. O funcionário não falou. 42.

Meu tio olha pra trás e olha pra frente novamente. Olha para o que estou escrevendo.

Uma senhora passa na minha frente. É mulata, alta, magra, alta. Tem o cabelo curto, liso. Veste uma calça preta, blusa verde, bolsa verde, sandália marrom.

Uma senhora passa na minha frente.

Um senhor passa na minha frente. Ele é alto, branco, cabelo castanho. Veste calça jeans preta, blusa polo marrom e careca um bolso.

- Como que a pessoa chega aqui, pega a senha e vai embora? Olha, 44 não tá aí. 285 não tá aí. Eu faço californiana... Olha lá o cara escrevendo, segurando o lápis na ponta do dedo. Dá pra ver daí? Estranho.

Meu tio lê o que estou escrevendo. Olha para trás. 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Em observação, no salão Maria Bonita - 8

Em observação, no Uber - 170

Em observação, na Mastermed