No dia 22 de outubro, com meu pai, no Hospital de Câncer

(Escrito dia 22 de outubro de 2022)

 

Hoje estive no hospital com meu pai. Ele está com metástase e câncer na laringe em estágio avançado. Muito emagrecido, como dizem as médicas. 

Ele é um ótimo paciente: pouco reclama, pouco pede. Apesar de gemer o tempo todo, seja dormindo ou acordado. 

Sente dor pra fazer xixi e fica chateado se precisamos mexê-lo na cama, como pra trocar as suas fraldas. "Me deixa dormir" é o que ele diz.

A equipe de enfermagem é ótima. E hoje, quando estive no meu plantão de sábado, conheci a Juliana, uma enfermeira negra, linda, de olhos grandes e amorosos. Parecia até dois amigos meus: João e Maria.

Hoje ela veio e disse: "só vim ver o senhor" e, quando me olhou sentada no sofá, eu estava aos prantos com tamanha delicadeza. "Obrigada pelo seu trabalho", eu disse a ela.

Da outra vez que ela veio, disse que veio me ver também. E chorei mais ainda.

Esses pequenos cuidados são comoventes.

Passei a tarde dialogando e chorando com a Sandra, uma grande amiga e irmã, de papo no WhatsApp. E li bastante. A leitura, dá pra colocar em dia. Um olho no velho, outro no livro, outro no WhatsApp.

Já no final do dia, no meio dos gemidos, que sempre corro pra perto da cama do pai, ele pediu que eu ficasse perto dele. "Senta aqui", e segurou na minha mão. Chegou pertinho do meu rosto e disse: "só quero que você seja feliz, minha filha. E que Deus tenha certeza do meu caráter e das minhas boas intenções". 

 

Às 18h, na penumbra do quarto 322 eu chorei. De soluçar. Mas sem fazer barulho.

Eu respondi que eu sou feliz e que Deus sabe das boas intenções dele, é claro. Disse também que o amava e que ele ficasse em paz.

 

Foi uma das muitas formas que podemos nos despedir. E de dizer do amor, da gratidão que foi podemos ter essa vida que tivemos, juntos.

E o meu sentimento, apesar da dor e tristeza, é de profunda gratidão.