No dia 23 de outubro, com meu pai, no Hospital de Câncer

(Escrito dia 23 de outubro de 2022)
 
Hoje cheguei cedo ao hospital. Não eram nem 08h da manhã.
 
Logo eu e Marcelo (o enfermeiro do dia) demos banho no pai. Ele não gosta e reclama o tempo todo durante o banho. Fica tonto, sobretudo quando viramos ele de um lado pro outro, e com dor (por estar muito magro). Apesar da água quentinha, reclama e diz que esta fria. Trocamos a roupa de cama, a roupa dele, e a fralda.

Ele queria dormir e dormiu logo em seguida. Durante o banho, reclama com "me deixa dormir" o tempo todo.

Ao longo do dia, pedia o seu charuto e pediu que anotasse coisas para o Jeremias, sobre as dívidas e juros deles. Dez reais de juros, anota. Eu anotava. E diz pro Jerê que eu penso sempre nele.

Dorme, geme e balbucia.
 
Nossos amigos Joaquim e João vieram aqui vê-lo. Ele conversou com Joaquim. E eu vi João escondido.

Pergunta o nome das pessoas que chegam aqui, no quarto. Além do enfermeiro Marcelo, tivemos a Isabel, a moça que ajudou na limpeza e que conversa sempre com ele, rindo e brincando.

Nem sempre as pessoas entendem o que ele diz, porque a voz está muito baixa, rouca, e cheia de catarro. Eu traduzo. Nem sempre eu mesma entendo, e ele fica aborrecido.
Ensino ele a falar mexendo bem os lábios pois assim consigo entender melhor e ler os lábios dele, mesmo sem som.

Hoje comecei um livro lindo e estou lendo emocionada, e chorando ao longo do dia.

Ele reclama de dor quando faz xixi, avisei e, por isso, vieram fazer o exame de urina nele e, para isso, passaram uma sonda. Ele gritou de dor e eu quase desmaiei, porque sou fracote pras dores alheias mesmo. Ele berrou, me olhou assustado, de mão dada comigo e disse: nunca mais faça isso comigo.

André veio visitar e ficou à tarde comigo aqui. Meu pai chamou ele de Kleber, um namorado que tive há mais de 20 anos e eu quase morri. Ainda bem que o André não é como eu: ciumento. Briguei com o pai e disse: tá maluco, mermão?

O pai delirou bastante ao longo do dia, e ficamos sempre na dúvida do quanto falar a verdade ou não sobre os delírios. Dar sentido pro delírio como se fosse real? Ou dizer pra ele que não, que não é nada daquilo.

Antes de eu ir embora, pegou na minha mão, beijou, eu beijei de volta e pedi a bênção. E ele disse que está passando pelos momentos mais difíceis da vida dele. E pousou a minha mão no coração dele, pra acalmá-lo, coisa que eu faço todas as vezes, muitas vezes por dia. Em silêncio, e com a mão no coração dele. Só isso. Sem reiki. Sem reza. Só contato e amor. Que é um pouco de reiki e reza também.

Quando a Gaeth chegou, já quase às 20h, mostrei a cama baixa, como deixo sempre, e ela pôde sentar na cama com ele, como sempre faço ao longo do dia. E disse a ele: vamos rezar antes de dormir.

E depois me avisou avisou que ele dormiu rezando com ela. Assim seja. E eu sou só gratidão.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Em observação, na Smart Fit - 161

Em observação, no salão Maria Bonita - 8

Em observação, no salão Maria Bonita - 17