Em observação, na Clínica
Hoje é sexta-feira. São 13h18.
Estou na Clínica de
Cirurgia da Obesidade, em Botafogo, aguardando ser atendida, às 14h40.
Estou sentada na
recepção. Ao meu lado direito, parte do sofá com a minha mochila e o celular em
cima. Ao meu lado esquerdo, sofá vazio. Na minha frente, um vão por onde as
pessoas passam.
A recepcionista está
atrás do balcão, no telefone. Ela é negra, magra, baixa. Tem o cabelo comprido,
encaracolado, preso num meio-rabo de cavalo. Veste calça social preta, blusa
social bege, sapato social preto, de bico fino, e está sentada na sua cadeira,
atrás do balcão. Como o balcão é alto, não consigo vê-la direito.
- Não, tá. Pode deixar. Não,
pode deixar. Vou sair daqui 15h30. Então. Tá, então pode deixar que eu vou sair
15h30 daqui pra ir com folga, tá. Tá, beijo.
Ela desliga o telefone.
- Meu Deus do céu, ele só
dá trabalho. Tá vendo o tempo que demora? Nunca atende rápido. Ainda fala que é
pra agilizar... Ai... tudo isso? Meu Deus do céu...
Agora permanecemos em
silêncio.
A recepcionista come
algo.
- Ai meu Deus, muita
fome. Dificuldaaaade!
A porta abre.
Três senhoras entram. Uma
permanece de pé, no balcão da recepção.
Uma senhora sentada ao
meu lado esquerdo e uma sentada ao meu lado direito, uma em pé na minha frente.
A senhora sentada ao meu
lado esquerdo é negra, um pouco acima do peso, baixinha, e cabelo preto, curto.
Veste um vestido longo, cinza e um casaco bege e um sapato preto.
A sentada ao meu lado
direito é negra, baixinha, um pouco gordinha, e tem o cabelo curto, grisalho. Veste
uma saia azul, blusa azul estampada e sandália bege. Está sentada, de braços
cruzados, sobre o colo.
A senhora sentada ao meu
lado esquerdo levantou e está lendo as coisas, no quadro. Sentou ao meu lado
novamente.
- Também de 20. Tudo de
jovem. Ah, mas eu quero ter.
A senhora ao meu lado
direito:
- Eu tenho cabeça de 20. Tenho
86 anos, mas cabeça de 20.
- A senhora de 96 anos. Bebe,
fuma, e vai pra pagode. Cabelo de ené.
O doutor chegou. Passou pela
gente, na recepção.
- A sogra da filha da
minha prima. Gente, que cabeça maravilhosa. Mora aqui em Laranjeiras, sozinha.
A outra recepcionista
chega e passa pela recepção.
- E ela adora a nora. O filho
fica tomando conta dela.
- Minha madrinha com 98.
- É, dona Alba com 98,
conversava bem a beça. Conversava muito bem, ela tinha a cabeça boa.
- Ela falava assim: cale
a boca, você não sabe mais do que eu.
- Ela quer que eu vá pro
aniversário dela. Eu falei: acho que erraram a sua idade. Deixaram apartamento
em Laranjeiras. As patroa dela tem uma arquiteta, aquela do arquivo. Fizeram um
filme, até com a Gloria Pires. Naquela época, elas já eram lésbicas. Não é como
igual hoje. Mas a neta dela, que é filha da minha sobrinha. E acharam
maravilhoso. E a neta veio pra traduzir. Ela achou maravilhoso a minha avó. Eu até
queria ver o filme. Foi falado, com a Gloria Pires. A Gloria Pires fazendo
papel de lésbica. Ela fez o papel dela, no filme. Ela cuidava das três. Ela tem
pensão de marinha, e ela dá pensão pra nora, porque ela dá a pensão pras
patroas. Ela não me deu o apartamento de Ipanema, porque ela não gostava do meu
marido. Mas deixou um em Laranjeiras. Ela mora aqui em Laranjeiras. Eu falei:
meu filho. Elas adotaram três meninas. E o filho dela criou do mesmo jeito como
criou as filhas. Tenente coronel. A casa dela, menina... igualzinho. Falou, meu
filho. É, né...?
- Vendeu documento
dele... Vem dizer pra ele... Meu Deus, Meu Deus. O enterro...
- Ele foi?
A porta abre. Duas senhoras
entram.
A senhora que estava ao
meu lado esquerdo, agora, senta ao meu lado direito.
E, ao meu lado direito,
outra senhora está sentada. É branca, magra, um pouco gordinha, e baixa. usa
óculos e tem o cabelo liso, curto, vermelho. Usa calça jeans, blusa branca e
amarela e carrega uma bolsa preta, no colo. Calça uma sandália bege.
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