Em observação, na Clínica Emílio Amorim

Hoje é terça-feira. São 10h15. Estou na recepção da Clínica Emílio Amorim, aguardando exame.

Estou sentada em um canto da recepção, onde tem várias cadeiras e exatamente 17 pessoas aguardando, como eu, seus exames.

Nas cadeiras exatamente à minha frente, não há ninguém. Do meu lado direito, três cadeiras vazias e, na quarta cadeira, um senhor. Na cadeira à minha esquerda, uma senhora no celular.

- Uhum. Uhum. É. Eu acho. Mais prático, né? Uhum. Uhum. Tá. A Nanda é que não tá passando bem. Dor de barriga. Muita dor. A única coisa que eles tomaram igual foi um suco de fruta de conde. Só. É. Uma dor atravessada na barriga. Ele mandou ficar de olho, mandou receitar lá o Floratil. Não. Não vai e volta. É uma dor de cólica. Mas vamos ver. Estou de orelha em pé. Hã? Já dei entrada nos documentos e tou bebendo água. Estou aguardando, o médico está atrasado. Tá bom. Tá bem. Beijo, tchau.

A senhora desliga o celular.

Ela veste calça branca, blusa estampada, casaco verde, e sapato alto marrom. Tem cerca de 45 / 50 anos. É magra, baixa, cabelo liso, meio alorado.

O senhor à minha direita saiu. E sentou um outro senhor na minha frente.

O senhor aparenta ter 80 anos. Veste uma calça marrom, blusa social quadriculada, azul, sandália marrom. É branco, bem engilhadinho e magro, usa óculos e tem o cabelo ralo, branco. Com a mão no rosto, ele observa as pessoas que entram na clinica. Levantou-se e saiu.

A senhora ao meu lado esquerdo usa, agora, óculos. Tem as pernas cruzadas. Pegou e ajeitou a bolsa. Mexe no celular, atenta.

Neste momento, ninguém ao meu lado direito e ninguém na minha frente.

O celular da senhora ao meu lado esquerdo é um iphone, com uma capa estilosa, bonita. Ele digita algumas coisas no celular.

Um senhor passa por mim e senta na minha frente. Veste calça social preta, blusa pólo beje, sapato preto. É alto, branco, bem magro. Tem cerca de 40 anos. Tem as pernas cruzadas e assiste a televisão, no alto, sério.

A senhora pára de mexer no celular, olha para a televisão, olha as unhas, volta a mexer no celular.

O senhor na minha frente levantou e saiu.

A senhora ao meu lado continua mexendo no celular. Ela se levanta e anda, na minha frente.

O senhor volta e senta na minha frente, no mesmo lugar de antes. Permanece na mesma posição que já estava: pernas cruzadas. Agora, o celular na sua mão e uma pasta, com possíveis exames dentro.

A senhora que estava ao meu lado volta caminhando, senta no mesmo local de antes, com um copo de água, que bebe. Fica na mesma posição, e continua mexendo no celular, com uma mão, e com o copo d’água, na outra mão. Ela coloca o copo da cadeira ao seu lado, onde está a sua bolsa. Espanta algo na sua blusa e continua mexendo no celular.

O senhor à minha frente, agora, mexe no celular.

A senhora ao meu lado bebe toda a água do copo, coloca o copo vazio no banco ao seu lado e continua, séria, mexendo no celular.

O senhor à minha frente volta a olhar para a televisão.

A senhora ao meu lado pega as suas coisas, se levanta e sai. O nome dela é dona Emília. Chamaram por ela na recepção, que fica em outra sala.

O senhor à minha frente tem os olhos fechados e parece cochilar. Abre os olhos, atende o celular.

- Oi Téo. Obrigado, Téo.

Ele desliga o celular e volta a assistir a televisão, sério.

Emília volta e senta-se no mesmo lugar. Traz mais um copo d’água e, agora, sem pernas cruzadas, lê um papel na sua mão. Guarda-o na sua bolsa. Fecha a bolsa. Cruza as pernas, e volta a mexer no celular.

O senhor à minha frente mexe no celular. Volta a olhar para a televisão, sério. Fecha os olhos e aparenta cochilar. Abre os olhos e volta a assistir televisão.

Emília bebe água. Coloca o copo – ainda com água dentro – do banco ao seu lado, onde está sua bolsa. Continua a mexer no celular, séria.

O senhor à minha frente fecha os olhos e, claramente, cochila, pois sua cabeça pende para o lado. Ele acorda, mexe no celular e volta a cochilar, com a cabeça pendendo para o lado. Chega a ter um bico e é engraçado. Ele é um homem bonito, mas, dormindo, todo mundo é indefeso e engraçado.

Emília também é muito bonita e elegante. No entanto, permanece séria e imóvel o tempo todo, sem tirar os olhos do celular.

O senhor à minha frente continua cochilando e, agora, a cabeça pendeu para a frente. E, para o lado. Ele abre a boca. E fecha. Respira profundamente. Levantou. Trocou de lugar e sentou ao meu lado direito. Fica na mesma posição que já estava, com a pasta e o celular no banco ao lado. Ele levanta e sai. Foi chamado. Seu nome é Bernardo Marcelo. Engraçado que ele tinha cara, mesmo, de Marcelo.

Agora, na minha frente e ao meu lado direito não há ninguém. Permaneço observando, apenas Emília, imóvel, que não pára de mexer (e de tirar o olho) de seu iPhone com a capa estilosa. Ela levanta os olhos e assiste televisão. Volta a olhar para o celular, séria.

Uma senhora passa pela minha frente e sai dessa recepção.

Emília olha para a televisão. Pega a água ao seu lado e bebe. Pousa o copo ao lado. Olha as suas unhas. Descruza as pernas e cruza no sentido inverso. Continua mexendo no celular. Ela pigarreia. Continua mexendo no celular. Guarda o celular na bolsa, descruza as pernas, espreguiça e olha para a televisão. Boceja, coloca o óculos preso na sua blusa, cruza a perna no sentido inverso e olha para a televisão. Olha para as unhas, pega o copo ao seu lado (no banco) e levanta, e anda na minha frente. Ela volta com uma revista na mão. Coloca o copo no banco ao lado, cruza as pernas, pigarreia. Coloca os óculos no rosto e, começa a folhear a revista, pousada na sua coxa. Ela coça a testa e volta a pousar as duas mãos na revista: uma segurando-a e a outra, folheando-a. Coça a nuca, olha as unhas, e volta a folhear a revista. Coça a nuca, volta a folhear a revista. Ela põe a revista de lado, cruza os braços e fica assistindo a televisão, séria. Agora, Emília tem braços e pernas cruzadas. Ela descruza as pernas e cruza-as no sentido inverso. Descruza os braços, ajeita o casaco, tira o óculos e prende-o na blusa. Tem as mãos cruzadas, pousadas no seu colo. Esfrega as mãos.

Uma senhora com problemas na perna passa pela nossa frente e sai da recepção.

Emília permanece sentada ao meu lado. Pernas e braços cruzados, olhando para a televisão, séria. Pega alguma coisa na sua bolsa. O celular, claro! Fica olhando para o mesmo. Tira os óculos preso na sua roupa e coloca-o no rosto. Pernas cruzadas, mexendo no celular, séria. Coça o rosto, olha para a televisão e volta a mexer no celular. Olha para a televisão, volta a mexer no celular, coça a sua perna, olha para a televisão, volta a mexer no celular. Guarda-o na bolsa, no banco ao seu lado. Tira os óculos do rosto, põe preso na sua roupa, passa a mão no rosto, suspira e cruza os braços. Agora, permanece séria, de braços e pernas cruzados, olhando para a televisão. Coça a nuca. Olha as suas unhas. Pousa as mãos, cruzadas, no seu colo. Continua assistindo televisão. Olha as unhas e cruza os braços. Descruza os braços, olha as horas, coça o olho. Fica com a mão no queixo, ajeita o cabelo, volta a pousar a mão no queixo.

- Senhora Luana?


Me levanto e saio. São, exatamente, 11h10. Fiquei exatamente 55 minutos em exercício de observação de Emília, Bernardo Marcelo e pessoas que vem e vão.

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