Carlinhos


Hoje a praia foi atípica. Carlos Henrique é o seu nome. Filho de uma das grandes, melhores e das mais antigas amigas: Carla.

É uma criança: oito anos. Eu não o tinha visto, quando fomos nos encontrar, na esquina da minha rua. Seus braços magros e pequenos abraçaram minha cintura e tive a deliciosa surpresa de passar um feriado-de-sol-no-meu-canto com uma criança que, eu já sabia, é encantadora.

Ele comeu biscoito Globo, bebeu mate-com-limão do Quinho, tomou picolé sabor chiclete, brincou de Mak-Steel (eu poderia procurar este nome na internet, mas eu sequer consigo pronunciar este nome). Brincou na sombra e no sol. A mãe e a tia Lu passaram protetor solar nele.

O mar estava gelado e forte; mas ele brinca na beiradinha - "ele é cagão", diz a mãe. 

Brincamos no mar juntos. De pular as ondas; de gritar (sim, gritamos quando estamos felizes); de enfiar a cara na água; de mergulhar; de pegar onda de bodyboard; de enterrar os pés na areia, quando a onda vinha; de Rose and Jack (tipo Titanic, de mãos dadas, e braços esticados); de jogar água um no outro; de procurar conchas; de olhar a própria sombra; e, quando a gente se distraía, ele vinha nos abraçar. No mar, na areia, na cadeira, na sombra: em qualquer lugar.

Contou piadas, anedotas e charadas. Nos matou de rir. Fez uma mágica indecifrável (estou tentando descobrir até agora), e achou o máximo ver a nossa cara de espanto com o truque (a minha cara era real, de espanto).

Na saída, antes de chegarmos no ponto de ônibus para nos despedir, estávamos no banco, no calçadão, acabando de nos vestir, pentear, tirar a areia, etc., vinha Carlos dar um abraço. Ele não pede abraço: ele dá abraço. É um abraço pequeno, de braços magros, próprio das crianças de oito anos. Mas um dos mais gostosos que já recebi.

Dentre tantas coisas que brincamos, eu e Carlos brincamos de celular. Ele me mostrou um jogo que ele gosta, de comprar carros, e dirigir carros, e o Pow, um bicho estilo Tamagochi (da minha época). 

Carlos me mostrou as roupas do Pow (o uniforme da escola e o terno, "pra ele passear").

- Mas ele estuda na escola e já tem terno?

- Tem, para passear.

Mostrou as roupas todas do Pow, as comidas, e como ele faz pra dar banho e fazer carinho no bicho-virtual. 

- O Pow tem uma bola de basquete, que ele joga futebol.

- Mas ele joga futebol com a bola de basquete?

- Sim. A de futebol era muito cara. E eu comprei a de basquete para ele brincar.

Eu descobrir que o "comprar" do Pow, adquire-se moedas jogando (isso é um jogo?) e, aí, pode-se comprar o que quiser para o Pow. Pode ser que ele tenha querido jogar bola (meninos e Carlos, em geral, gostam), mas a de futebol era cara: compra-se a de basquete, neste caso.

Este blog, chama-se Fotografando Gente. Eu gosto de fotografar gente. Com o celular, a câmera, e as palavras. 

Vi uma cena do Carlos: comendo biscoito Globo, e brincando-de-algum-jogo-no-celular, sentado à sombra, e click: foi com o celular. Direto, a foto vai para o facebook.

Alguns adultos comentaram: "com esta idade, eu brincava de x-y-z", e "as crianças perderam a criatividade da minha época. Com a globalização, a infância acabou". 

Restaram-me algumas dúvidas:

- Adultos, vocês brincam com seus filhos, sobrinhos, netos?
- Vocês interagem com pessoas desconhecidas na rua, ou "interagem" pelo whatsapp, instagram, facebook, twitter, no celular?
- Vocês apontam e criticam as crianças que brincam na virtualidade e vocês, brincam aonde?

Nestas questões, o dedo está apontado para mim, também.

E, eu não sei vocês, mas das horas que ficamos na praia, eu e Carlos brincamos muito. Na vida real. Conosco e com gente desconhecida.

Eu não sei esse tal de Carlos Henrique, mas eu sou uma mulher de muita sorte, por tê-lo como amigo.

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